Os aforismos de Zaven Paré tomam quase sempre a forma de delicados epigramas morais e didáticos, nos quais o humor imperturbável diante do caos evidencia o nonsense, mais por sentido de lógica do que de revolta. O cerne desses aforismos epigramáticos ensina que, de tudo o que se plantou na fazendona do Brasil, nada dá e cresce mais do que três insumos ou ativos estratégicos: postos de gasolinas, igrejas evangélicas e shopping centers. O mais surpreendente é que os três ativos são perfeitamente intercambiáveis entre si, sobretudo quando incrementados pelos algoritmos da internet, das redes sociais e da IA. Assim a extinção do futuro, implícita na extração do combustível fóssil, é equivalente a um doce anúncio da segunda vinda de Cristo, agora um player próspero e influencer máximo,embalado a vácuo.
No pós-fim do mundo, compramos sempre o desnecessário e sem valor, desde que seja caro e imite a cara de um desejo secreto. Na alucinação provocada por excesso de ar-condicionado e luz de led, nada eleva mais do que a obediência de rebanho em direção à compra. Pois lá no fundo do coração está a compra. O afeto mais sincero é o valor agregado da mercadoria.
Assim, no admirável shopping center de Zaven Paré, o corpo e o sangue de Cristo jorram aos pacotinhos dentro de um excitante caixão refrigerado. A distopia se evidencia na oração pela vaga do estacionamento, no culto da vitrine, na procissão da fila do provador, no amor pelos itens da prateleira. Na liturgia do vazio, enfim, a comunhão arrebata direto ao caixa.
Alcir Pécora


Nas frestas das fendas 