E entre esbarrões: experiências clínico-políticas e a casa jangada

“Um livro jangada. A leitura nos coloca no deslizamento de uma jangada no mar. Sentimos sua velocidade, com os pés molhados na água que vaza, nem muito rápido nem muito lento, variando conforme as condições das correntezas.

O verbo é singrar.

As ideias são apresentadas sem que se sinta a necessidade de nos determos nos conceitos. Na verdade, os conceitos são sinais de indicação que nos aproximamos de alguma região especial da travessia. É um minimalismo do conceito sem que o mínimo seja índice de insuficiência, mas uma estratégia de aceleração do texto.

Trata-se de um ensaio na dupla acepção da palavra: uma tentativa ou experimentação, mas também uma forma textual entre o acadêmico e o literário que se caracteriza pela liberdade da escrita.

A liberdade da errância. A afirmação do erro indica o sentido – direção, significado e regime de sensibilidade – da pesquisa que origina o livro. O texto segue uma linha de errância como aquela que F. Deligny percebia nas cartografias dos trajetos das crianças autistas em Cévennes. O método é cartográfico.

A linha de errância do livro se confunde com a errância da Casa Jangada que não é propriamente o objeto de uma pesquisa, mas seu setting. Como fazer pesquisa em um projeto de saúde mental como a Casa Jangada? Não falando sobre ela, nem exatamente com ela, mas nela.

Em uma jangada, embarcar é quase como desembarcar. Na Casa Jangada, é preciso desembarcar da clínica para estar nela na rua, nos dispositivos grupais, no passeio do esquizofrênico. Curiosa operação de um trabalho que não se duvida ser clínico, embora tirando a clínica de qualquer pretensa centralidade.”

Edu Passos