[Livro em pré-venda – envio a partir de 20 de novembro]
Romance de estreia de Daniel Guerra, Fléti e Míris brota com força de um dos mais encantados veios de tradição da prosa latino-americana: o que traz à flor da palavra a convicção de que nossos pequenos mundos cotidianos, dos llanos mexicanos à Terra do Fogo, de Macondo a Buenos Aires, de Seabra a Turviana, se afiguram como uma filigrana inexplicável de milagres – para quem souber percebê-los. De passagem pelo interior da Bahia, ao parar para um sanduíche em um bar qualquer de estrada, um professor atormentado se depara com o desconhecido a quem chamam de Leitor, e isso basta para tecer um fio mágico que, longe de nos resgatar, nos conduz para cada vez mais longe em um labirinto de fábulas.
Em sua narrativa em vórtice, na qual se engalfinham os discursos de Eu e de Leitor, dobramos os becos e vielas de Fléti e Míris sem saber exatamente quando o chão faltará aos pés, mas nada é mais sedutor que esse chamado para atravessar a teia dos eus do romance, envolta em neblina de álcool e de tabaco, na qual perseguindo as personagens acabamos por descobrir que, na verdade, é por nós que avidamente procuramos.
Aqui, como em tantas realizações memoráveis da literatura, há mais que um único livro. Fléti e Míris é também as obras nunca concluídas por seus protagonistas e os livros que destruíram e os hieróglifos que herdaram como memento mori e é ainda o Evangelho Apócrifo de Enoque e o Livro dos Vigilantes (que eu, particularmente, duvido que se tratem da mesma obra). Livro entre livros, eu entre eus, Fléti e Míris alcança tudo isso sem se perder nos desvãos do ensimesmamento, apostando sempre na paixão pela palavra e sempre nas paixões de quem lê.
Corre a ideia de que a literatura é o que temos hoje de mais próximo da função primeva e absoluta da linguagem: encantar o mundo. Se assim for (e eu acredito que seja), você tem diante de si, agora, um livro mágico, cuja palavra encantatória desperta demônios e tempos, paixões e mundos. Poucos primeiros romances terão nascido com tanta força, mesmo (e sobretudo) nas vezes em que Fléti e Míris parece transmutar-se, diante de nós – seja em um poema ilegível, seja em uma criatura marinha banhada por luz suave, “azul, muito azul, viva e alerta”.
Marcos Barbosa


As duas
Corvos contra a noite
Espaço, corpo e tempo
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Eco de sinos sobre a cidade
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Uma história à margem – segunda edição
O exílio de Augusto Boal
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No avesso da genealogia
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As amarras 